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sábado, 9 de abril de 2011

Sobre o amor e outras coisas...*


Há tempos prometo à autora deste blog um post "convidado". Em tempos de Bolsonaro (o deputado que andou metendo os pés pelas mãos com declarações sobre gays e negros) e blogs e correntes (e-mail) divulgando um compilado com mensagens um tanto quanto antiquadas como "se os pagãos têm medo de ter filhos, nós não podemos ter. Quem não está preparado para ter filhos não deve se casar. Casou é para ter filhos. A glória de seu casamento é você dá (sic) filhos para Deus", ficou claro pra mim que quem tem o que falar, tem que falar, certo?
Pela convivência, hoje impossível e desumana sem a tolerância, é sabida a necessidade de ouvir algumas coisas e deixar sair pelo outro ouvido ou ler outras e, simplesmente, deixar pra lá, afinal liberdade de expressão, de crença, entre outros, é um baita benefício da democracia.
Mas, então, vamos esclarecer algumas coisas. Para isso, até vou me apropriar de um trecho da entrevista do ator Wagner Moura à revista Rolling Stone. Ele comentou que o casamento é a instituição mais moderna que existe, pois as pessoas não precisam de outra razão para estarem juntas que não o amor. Filhos não podem ser a única razão de um casal. Muito peso para uma criança e para qualquer adulto também, não acham? A submissão da mulher, apoiada na dependência financeira é uma possibilidade tão absurda (pelo menos nos grandes centros urbanos), que nem vou discorrer sobre isso. Status a gente sabe que segura muitos casais, mas aí já é um desvio que me escapa... Hum... que mais? O sagrado matrimonio perante as leis divinas... isso segura muitos casais também e, de verdade, eu acho que tudo bem. Cada um segue a crença - e suas regras - se assim lhe fizer sentido, sendo feliz ou não.
O importante é, e nada além disso, não tornar verdades particulares em verdades absolutas. A verdade da vida, da história de cada um, começa e termina dentro de si. É o clichê máximo de que o que funciona para mim pode não funcionar para você.
Eu sou gay e, acreditem se quiserem, eu não escolhi ser gay, assim como muitos leitores deste blog não escolheram ser heterossexuais, simplesmente são. A minha criação, provavelmente, seguiu todos os "padrões" morais e éticos defendidos bravamente pelas religiões que imperam neste País. Logo cedo, frequentei a igreja e fiz todos os cursos que ela diz que temos que fazer. Vestida de branco e com toda a família presente, fiz a "Primeira Comunhão", cantei todos os cânticos e sorri para todas as fotos.
Me interessei por alguns amigos. Namorei alguns amigos e fui bem feliz. Fui feliz depois quando, sem culpa (e aqui agradeço à Ele pela paz com que sempre lidei com isso), me interessei por garotas e me permiti experimentá-las. Fui novamente feliz quando, sem amarras, dúvidas e, novamente, culpa, me interessei novamente por garotos e me permiti reexperimentá-los, rs... e assim, sucessivamente...
Quem me conhece de longa data, ou convive comigo há tempo suficiente para conhecer minhas histórias, talvez diga que minha mãe foi liberal demais. Eu digo que não. Eu digo que ela criou um ser capaz de entender, aceitar e viver a sociedade moderna. Ela criou uma pessoa com valores fortes o suficiente para ter uma profissão, ser independente, querer criar a sua família e, tendo filhos, se preocupar somente em fazer deles pessoas íntegras, bacanas, responsáveis, educadas e, principalmente, tolerantes.
A minha família inteira sabe que sou gay e, obviamente, nem todos entendem e nem todos falam abertamente sobre isso na minha frente. Mas, sem exceções, me respeitam. Às vezes, vacilam, mas é humano, é cultural, é "religioso" e eu entendo.
Eu tenho a minha família. E com a Patricia, a minha companheira, esposa, mulher, como preferirem, estou construindo o meu lar, somando uma coisa à outra, uma família à outra, como tem que ser. Como é! Eu ainda não decidi se quero ou não ter filhos. Sou livre para tê-los ou não. E eu tenho certeza absoluta que o Cara não me fechará as portas do Céu caso decida não tê-los (sim, eu acredito em Céu, em Deus, em tudo isso. Eu vivo pedindo e Ele vive me atendendo, inclusive. Só não acredito na manipulação toda quando decidem contar Sua história).
Querer um filho fará de mim uma mulher como todas as outras, mas ao mesmo tempo, uma mulher como tantas outras corajosas por aí, que justamente com o genuíno desejo de transbordar o amor que existe dentro delas, querem replicar, multiplicar, continuar, repassar, ensinar... tendo seus filhos um pai, outra mãe, ou nenhum dos dois. Porque está provado que famílias "tradicionais" não isentam o ser humano de ser a melhor pessoa do mundo, uma pessoa trivial ou uma pessoa desprezível.
Eu só tenho uma verdade que faço questão de ser a "minha" verdade absoluta. Eu tenho MUITA PENA de mães que não reagiriam (e até devem rezar e pedir a Deus para não precisarem passar por esta "provação") como a minha mãe reagiu em uma de nossas conversas sobre o meu amor por uma mulher. Com lágrimas nos olhos (porque é absolutamente compreensível a tristeza de uma mãe, que normalmente sonha sonhos por você, ao receber uma notícia como esta), ela me ouviu calmamente dizer que eu só queria ser capaz de ter uma casa, um lar, com uma pessoa em que eu pudesse enxergar nos olhos tanto amor como eu via nos olhos dela e do meu pai quando estão juntos... O que ela disse? Ela não disse nada.
Ela sorriu e ali, ali eu soube que ela me entendeu. E ali ela soube que poderia ficar tranquila. Ela tinha me dado a exata medida do valor dela para a vida. O amor.
Porque só quem ama o próximo (desenhando: o próximo como "humanidade", não uma pessoa específica)... só quem ama o próximo, é capaz de respeitar a sua singularidade. E se tem uma coisa que, embora ninguém diga, tenho certeza que nem de joelhos Ele perdoaria, é a falta de tolerância, representação máxima da falta de respeito com o ser humano.
*Grifos deste blog